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Dia Internacional da Mulher celebrado nas três freguesias do concelho de Arronches

 

 

O Dia Internacional da Mulher, celebrado a 8 de Março, é uma data de grande importância para reconhecer as conquistas sociais, económicas, culturais e políticas das mulheres em todo o mundo.

A origem do Dia Internacional da Mulher remonta ao início do século XX, num contexto de intensas reivindicações por melhores condições laborais e direito ao voto feminino. A data de 8 de Março foi oficialmente reconhecida pelas Nações Unidas em 1977, consolidando o seu significado global.

As mulheres ainda enfrentam desafios como a desigualdade salarial, a violência de género e a falta de representatividade em cargos de liderança. Hoje, o dia é celebrado de diversas formas, incluindo eventos, palestras, campanhas de sensibilização e homenagens. Tem sido ao longo dos anos que os executivos das três freguesias do concelho de Arronches, homenageiam as suas mulheres com um almoço de confraternização, com animação musical e algumas recordações que podem ir de uma simples flor, a algo com significado político das respectivas freguesias, tal como uma caneca ou um guarda-chuva/sombrinha, com o seu logótipo.

O Dia Internacional da Mulher tem um impacto significativo na sociedade portuguesa, promovendo a consciencialização sobre os direitos das mulheres, a igualdade de género e o combate à discriminação. A violência doméstica continua a ser uma realidade preocupante em Portugal. Nos últimos anos, Portugal tem assistido a um crescimento da representatividade feminina na política e nos negócios. No entanto, esse crescimento é menos acentuado em territórios de baixa densidade populacional e literacia, como é o caso do interior desertificado

Fernando N. Marques|Director

Luís Mergulhão

 

Herói ou vilão?

Em meados de 1996, quando ainda jovem estudante do curso de Mestrado em Sociologia da Universidade de Évora, fui convidado, juntamente com alguns colegas, para irmos às Alcáçovas, concelho de Viana do Alentejo, almoçar com um personagem que estava a desenvolver um trabalho extraordinário naquela localidade do Distrito de Évora na promoção do desenvolvimento em espaços rurais. Foi, então, nesse momento que conheci Camilo Mortágua, um homem que, confesso, me impressionou pela forma como nos recebeu: simples, afável, educado mas ao mesmo tempo intimidador pela sua forma de falar, pela maneira como nos expunha as suas ideias sobre o que estava a fazer e o que queria continuar a fazer naquele território tão deprimido em que baseava a sua actividade e no qual havia criado a Terras Dentro - Associação Para o Desenvolvimento Integrado, pela sua linguagem corporal e pelo carisma que se lhe reconhecia. Enfim, um homem com um carácter forte, ciente das suas ideias, convicto daquilo que fazia e, acima de tudo, um homem com História. Foi, para mim, um privilégio partilhar um dia com personagem tão marcante, a ponto de ainda hoje recordar esse momento com grande satisfação. 
Naturalmente que fiquei muito bem impressionado até pela forma como pude “beber” das suas palavras conceitos, estratégias e perspectivas, que depois me foram extraordinariamente úteis para o trabalho de investigação que estava a preparar e percebi que ali tive ocasião de partilhar ideias com alguém que marcou um Tempo na nossa recente História colectiva. Pois bem, Camilo Mortágua faleceu no passado dia 1 de Novembro, em Alvito, no Distrito de Beja, aos 90 anos e a sua morte levantou não só um grande debate sobre o seu papel no combate ao Estado Novo, no combate pela liberdade, no combate pela democracia, mas também sobre a sua actividade política após o 25 de Abril de 1974, sendo que para uns ele foi um herói e, para outros, ele foi um vilão. Como é óbvio, não me compete a mim tomar partido nem é isso que se pretende neste artigo.
A História de Camilo Mortágua confunde-se um pouco com a História da resistência ao infame e criminoso Estado Novo. Quem conhece um pouco desse período negro de Portugal, ou porque o viveu ou porque sobre ele tem lido e tem estudado, que se prolongou desde 1933 (quer dizer, de facto desde o golpe de 28 de Maio de 1926), até 25 de Abril de 1974, sabe que Camilo Mortágua foi um revolucionário anti-fascista muito activo e, nesse papel quase romântico, teve uma participação fundamental em três das acções revolucionárias mais espectaculares daquele período e que ficaram indelevelmente marcadas na memória colectiva e ainda hoje são recordadas pelos mais velhos e por aqueles que não querem deixar cair no esquecimento o martírio do Povo português: o Assalto ao Santa Maria, um paquete de luxo que navegava para Miami, nos Estados Unidos, cheio de turistas a bordo (para além da tripulação), em consequência da qual faleceu um dos pilotos; o desvio de um avião da TAP, cuja acção pretendia lançar sobre a cidade de Lisboa (mas não só) panfletos e propaganda anti-fascista (foram lançados cerca de 100.000); e, finalmente, a terceira acção em que CM esteve envolvido foi o assalto à mão armada da dependência da Figueira da Foz do Banco de Portugal.
Depois do 25 de Abril de 1974, CM continuou com a sua participação revolucionária, agora defendendo, por exemplo, acções de ocupação de terras no âmbito ideológico da extrema-esquerda, pois o seu objectivo era implementar em Portugal um modelo político marcadamente marxista-leninista (até trotskista), na dependência da então União Soviética. Viviam-se tempos conturbados a nível internacional, em plena Guerra Fria que dividia o Mundo em duas partes, uma sob influência soviética e outra sob influência americana e, neste contexto, CM não duvidou em colocar-se do lado, que, para mim, é o lado menos bom do conflito que esteve permanentemente à beira de deflagrar.
Ora bem, feita esta breve resenha sobre a actividade revolucionária, parece-me justo que se aceite que Camilo Mortágua desempenhou um papel relevante no combate político ao regime salazarista, um regime que amordaçava o país e mantinha os portugueses na pobreza, na miséria, no obscurantismo, no analfabetismo e, a partir de 1961, numa guerra sem quartel em África que consumia uma juventude que era maioritariamente contra o conflito. Isto é inegável e mesmo o argumento de que, em consequência de uma das suas acções, houve a lamentável perda de uma vida, não pode colocar em dúvida os objectivos nobres da sua actividade, pois nem vale a pena comparar o número de vítimas provocadas pelo Estado, seja na guerra em África seja nas prisões e campos de concentração com aquele lamentável acidente que resultou do assalto ao paquete de luxo. 
Toda a sua actividade revolucionária, bem como a de outros seus companheiros, tem de ser entendida num contexto que não é o actual e, nesse sentido, o seu contributo para criar os alicerces para a posterior revolução de 25 de Abril de 1974 é inegável e todos os portugueses devem estar agradecidos a este homem. Outrossim é a sua actividade pós-revolução, essa sim, eivada de excessos ideológicos, os quais defendeu acerrimamente até ao fim. A este nível, a minha postura ideológica não é compatível com a de Camilo Mortágua, como sabe quem costuma acompanhar os meus textos aqui no Notícias de Arronches. Neste contexto, dificilmente posso aceitar a implementação de um regime totalitário após a queda de outro regime da mesma natureza mas de conceptualização ideológica antagónica, que foi o que a extrema-esquerda, de que CM fazia parte, sempre desejou.
Felizmente um grupo grande de personalidades, sejam militares ou civis, viram mais longe e defenderam Portugal do totalitarismo de esquerda, mas é de inteira justiça reconhecer os méritos de homens como Camilo Mortágua na luta contra Salazar e o Estado Novo. Concorde-se ou não politicamente, mais do que herói ou vilão, a História tem-se encarregado de colocar no seu devido lugar o legado de um homem que agora nos deixou e cuja vida muito contribuiu para podermos viver em liberdade.

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